quinta-feira, 27 de novembro de 2008

terça-feira, 18 de novembro de 2008

-não está notando nada de diferente?
-... - um meneio negativo com a cabeça se uniu ao silêncio esclarecedor.
-cortei seu cabelo. enquanto você dormia. - o sorriso em sua face não era cínico, tampouco sarcástico. mas o prazer febril com que falava aquilo deixava transparecer algum sentimento desses que não conseguimos explicar, que tornam as palavras imprecisas e incapazes.
-o quê!?
um desconforto palpitante e latente se instalou nas faces das duas, que permaneceram se olhando e começando a entender o ódio que as unia ternamente através de todos aqueles anos. descobriam razões obscuras e acusadoras em tudo aquilo, e buscavam na memória todo e qualquer gesto que já as tivessem incomodado, e reviviam cada segundo de raivas pequenas. se dedicaram, nos momentos que seguiram aquele, ao culto aos incômodos acumulados e falsamente piedosos e respeitadores.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

mutilação

longe dos que eu queria perto.
desencontrada da essência.
furtada de pedaços da alma.
sem o que me fazia eu.

domingo, 16 de novembro de 2008

controle?

tudo se punha em ordem, desordenadamente e sem que ela pudesse ter o controle real da situação. só lhe cabia esperar e sobreviver à organização voluptosa que a vida lhe impunha. não importava se ela já não queria conforto e acomodação, nada poderia parar aquele ciclo iniciado, de sobriedade e calmaria. era como se ela tivesse envelhecido algumas dúzias de anos e todos ao redor lhe escolhessem uma vida de quietude. existem pessoas que só procuram algumas coisas, e tudo na vida delas se encaixa ao analisar se há conforto suficiente para que tal situação possa ser considerada boa. essas são as pessoas que acreditam no óbvio dualismo, as que só veêm o bem e o mal. ela não era assim. mas também já não sabia como era, na realidade, antes daquilo tudo começar. ela já não se sabia de qualquer natureza que fosse. então, se deixava levar pelo fluxo da vida, que tramava com o destino formas de fazê-la despertar do sonho lúcido.

sábado, 15 de novembro de 2008

o dia é tão longo que nem sei.
as horas se arrastam e eu tento entender.
é tão duro o trabalho do tempo em nós...
o tempo desacalenta e desgoverna.
tira a paz e a plenitude.
faz pior: tira as pessoas.

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

partida

euforia passageira, apatia constante.tudo é tão fugaz que não se dá nem o trabalho de camuflar-se.a efemeridade escancara a crueldade da vida e aperta as janelas da alma.

bruno, volta?

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

as notas se seguiam, dando a ela a impressão de morte iminente. mas não era toda morte iminente? sentia uma dor constante, como se cada célula sua devanecendo pudesse lhe atingir causando luto. suas angústias permanentes eram que lhe davam o prazer e o luxo da inconstância. para quê lutar por ser linear e fazer o que esperavam dela, se a dor seria a mesma, sempre? ela se programava por música, ou se remediava. não precisava refletir muito sobre suas sensações perante os acontecimentos, bastava analisar as músicas que escolhera para ouvir. ela não respirava música. respirar significa tornar íntimo algo que é necessário, mas reter uma só parte, o que lhe interessa, e despejar tudo que restou para fora, como em um vômito. a música se fundia à sua alma. era mais que necessidade. era desejo [conforto].

os dias passam e seguem para onde eu não sei.

terça-feira, 11 de novembro de 2008

aliterado

"...não adiantam lutos derradeiros, nada que olhe para trás adianta. quero algo que olhe para frente, dessa vez alcançarei um futuro valioso, sem essas memórias servindo de fantasma e tropeço. eu quero parar de ser minha própria barreira, quero poder culpar alguém. já chega dessa auto-suficiência até para os pecados. eu sou meu deus e seguidor, em uma religião nada indulgente. a mentira é minha salvação. quero mais que essas coisas que vejo, não quero mais ficar confuso por não saber qual parte da minha vista não pode ser vista pelo resto do mundo. eu quero é mais. mais que essa vida..." - com esses pensamentos decisivos, seguiu.
Na sala, uma mulher o esperava. Aparência grave mas suficientemente gentil para que não fosse detestada de imediato. Os cabelos no rosto, evidenciavam algo de uma rebeldia que já fora bem mais que apenas insinuada. O esmalte descascado das unhas lhe emprestava um ar de desleixo que só os desocupados têm. Os olhos, claros mas não muito, fitavam a porta desde duas horas atrás. Quando a porta se abriu, o levantar dela foi quase instantâneo. Braços lutaram, costas arquearam-se e rostos se apertaram. Foi um abraço. O mais longo em, no mínimo, um ano. O desespero sempre remedia as corrupções do tempo. O tempo não lhes era favorável. Nunca havia sido.
Começou a falar para a mãe tudo que o angustiava, num ritmo que cadenciava como que para demonstrar a loucura à espreita. O olhar raivoso mostrava, na verdade, medo. Mais que isso: impotência. Jovem, com a ignorância dos que tudo dominam, ditava suas verdades contrapostas sob o olhar amável e preocupado da mulher que o havia amado desde a hora que o soubera seu. As frases enrolavam-se em vários quase-choros, que, sucessivos, presenteavam-lhe com uma aura infantil. Não era, mesmo, muito mais que uma criança indefesa desconsolada pela ausência repentina dos protetores e sob uma injustiça. Era só o mesmo que já havia sido há alguns anos: alguém assustado. Nunca deixara de ser, talvez nunca deixasse.
Por trás dos olhos de amêndoas amargas, pensamentos se queixavam do cheiro ruim que emanava dele. Perguntava-se por onde ele havia andado, em todo aquele tempo. Desde quando ele sentia aquilo? Em que momento adquiriu as mágoas e dores dos que já já existem há tempo bastante para perceber o sofrimento de viver? Quando crescera em tormento? Quando ficou, mais que nunca, semelhante a ela mesma? Em seus olhos nada disso se via: a passividade aparente era sua maior atividade.