domingo, 5 de abril de 2009

faz tempo

Tenho sonhos em preto e branco, ouço vozes roucas, chamados constantes. Vivo em uma eterna fantasia, falo sozinha, irrito-me com o perfeito. Sou o retrato da demência. Carrego em mim todas as neuroses e psicoses em elevado estágio de evolução, minha essência é loucura e meu espírito é delírio. Possuo as marcas do desvario: a credulidade na verdade inexistente, a busca pela felicidade perdida não sei quando, a desonfiança nos que se dizem normais e olhos que miram o infinito mesmo fitando um objetivo material e frívolo. Ou em frente ao espelho. Principalmente em frente ao espelho, aliás... Cada dia não reconheço os traços do caos, a ebulição íntima que me toma a todo momento se faz visível em minha face maldita que não consegue resistir aos encantos da alma que nada faz além de sua própria vontade baseada em razões néscias e entorpecidas. A sobriedade que me restara transformou-se em fumaça, e de fumaça em nuvem, que precipitou-se em cima de meu reino utópico e fez chover radiação cancerígena sobre os sentimentos. O átomo desencadeante e quebrado fui eu mesma, partilhada, alterada e excitada, na constante venda de meus princípios duvidosos e valores baratos, de meus desejos vadios e provenientes da desordem. Tudo em mim é xepa, sou a carne gordurosa e nervurenta que restará entre as migalhas de tua mesa, ao menos que resolva ingerir-me e infectar tuas entranhas com o sabor putrefato que é inerente a mim. Conquistei a excelência da vagabundagem, busco o primor da ironia. Os apuros me são enojantes e a perfídia me acena ao lado. Se meretriz rima com perfuratriz, serei eu a enfiar-me me ti, e retirar o que ainda pode haver de bom entre tuas tripas com minha pua blindada com o significado alienado da extravagância presente no mundo sórdido do qual fazes parte. De podridão e devaneios me faço. E de sofrimento e sarcasmo me alimento, nada mais posso fazer senão tentar iludir-me que a lúcida sou eu e todos os outros padecem de distúrbios gravíssimos e incuráveis. Perjuro a própria insensatez espontâneamente de vez em quando para nem à ela me aprisionar. Minha sólida base é a ilusão, e o clamor da moral só tem de mim a resposta da surdez. Meus ruídos ásperos, cavos e espalhafatosos só servem pra sinalizar meu estado. A estridência de que me utilizo é falsa, mordaz e objeto de meu desfrute e consequencia da alucinação permanente. Me recuso ao tratamento por saber que para mim não há cura, uma vez que não há doença. Sou a dualidade em pessoa, o paradoxo encarnado, as duas faces da moeda em sensações, o antagonismo revelado, enfim, sou eu. Nada do que faço tem razão lógica dentro de si, tudo é infundado, desprovido de todo e qualquer respaldo imaginado. Sou o fruto da desordem, o resultado da desilusão, o deleite criminoso das paixões liberadas. Quando nada mais importar, e só quiseres birncar com as fartas e nefastas possibilidades, quando não tiverdes mais esperanças, quando nada mais possa ruir a não ser teu frágil fôlego vital, quando fores abandonado e cruelmente rejeitado, quando te tornares escravo das circunstâncias, serás tomado pela mesma essência que agora me compõe, te tornarás meu irmão idêntico em espírito e corpo, terás o brilho da insanidade no fundo das janelas de tua alma, que enganará e só se identificará realmente para teus novos e compreensivos parentes, singelos psicopatas, monstros mentais ensandecidos.

3 comentários:

Paterson Franco disse...

......!!!!!!!!!!

paulo calvet disse...

as dores, pintadas com teu pincel, de ordinárias parecem únicas.
teu cinzel esculpe realidades em sépia.
tua palavra é viva e narra os enlevos e as agonias de ser.
prossiga, prossiga...

PR disse...

não sei o que dizer.